Quando tratamos de Transfer Pricing de acordo com as diretrizes da OCDE, sempre vem à tona algumas transações que não são compreendidas na legislação brasileira, tais como:
- Intangíves
- Serviços Intragrupo
- Acordo de Contribuição de Custo
- Reestruturação de Negócios
- Transações Financeiras
Desta forma, resolvemos escrever um artigo para cada um desses temas. Hoje o tema é Serviços Intragrupo.
Para começar, você sabe o que é um serviço intragrupo?
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) fornece orientações sobre preços de transferência para serviços intragrupo em suas Diretrizes de Preços de Transferência para Empresas Multinacionais e Administrações Fiscais e o define como "uma atividade (por exemplo, administrativa, técnica, financeira, comercial, etc.) para a qual uma empresa independente estaria disposta a pagar ou executar por si mesma."
Isto é, os serviços intragrupo referem-se a serviços prestados por uma empresa dentro de um grupo MNE para outra empresa dentro desse mesmo grupo MNE.
Identificando Serviços Intragrupo
Você só pode classificar uma atividade como um serviço intragrupo se ela fornecer à empresa relacionada "valor econômico ou comercial para melhorar ou manter sua posição de negócio". Você pode descobrir se este é o caso identificando se uma empresa independente, em circunstâncias comparáveis, teria pago uma parte não relacionada pelo serviço ou realizado internamente. Isso é conhecido como o "teste de benefícios".
Se você descobrir que uma empresa independente em circunstâncias comparáveis, teria pago à uma parte não relacionada pelo serviço ou realizado internamente, então ela poderia ser classificada como um serviço intragrupo.
Porém, existem situações e circunstâncias que requerem análises mais complexas para identificar se um serviço intragrupo foi prestado:
- Atividade de Acionistas - Se uma holding prestar um serviço a um dos membros do grupo MNE em sua capacidade como acionista, isso não contaria como um serviço intragrupo. O membro do grupo MNE provavelmente não solicitou o serviço e, como tal, a Empresa Mãe deve arcar com os custos. Isso seria classificado como uma atividade de acionistas em vez de um serviço intragrupo.
- Duplicação - As atividades geralmente não são classificadas como serviços intragrupo se eles simplesmente duplicarem um serviço que outra empresa do grupo MNE já está fornecendo. As exceções a isso são se a duplicação for apenas temporária ou intencional para reduzir o risco de uma decisão de negócios errada.
- Benefícios incidentais - Às vezes, os membros do grupo MNE podem se beneficiar, incidentalmente, dos serviços prestados a outros membros do grupo. Tais benefícios incidentais normalmente não contam como aqueles membros do grupo inadvertido que recebem serviços intragrupo, pois, em uma situação entre partes não relacionadas, a empresa independente não estaria disposta a pagar pelo serviço.
- Serviços de Plantão - Alguns serviços são prestados sob demanda. Uma Empresa Matriz pode oferecer serviços gerenciais, técnicos, financeiros ou jurídicos aos membros de um grupo MNE como e quando precisarem. Com serviços que são prestados de plantão, uma taxa separada de "espera" é frequentemente cobrada pela disponibilidade de serviços de curto prazo, além da taxa de serviço para o próprio serviço. Para fins de preços de transferência, você precisa determinar se a disponibilidade de serviços de plantão pode ser classificada como um serviço separado em si, para o qual o contribuinte precisa determinar a taxa de duração arm's length. Se você concluir que uma empresa independente em circunstâncias comparáveis incorreria em taxas de espera para o serviço, então você deve classificar a disponibilidade do serviço como um serviço intragrupo em si mesmo, e identificar a carga arm's length adequada.
Transfer Pricing Serviços Intragrupo - Como determinar
Você precisa considerar:
- O valor do serviço para a empresa receptora
- O montante que uma empresa independente estaria disposta a pagar por ela em circunstâncias comparáveis e
- Os custos do prestador de serviços.
Uma vez identificado que um serviço intragrupo foi prestado, você precisa determinar se a taxa de serviço cobrada estava de acordo com o Arm's Length Principle.
O primeiro passo para isso é identificar se os grupos do MNE cobram de forma direta ou indiretamente as empresas associadas a prestação de serviços entre elas.
Método de Cobranca Direta: Um método de cobrança direta significa que as empresas associadas cobraram umas às outras diretamente por serviços específicos. Os grupos MNE são encorajados a usar arranjos de cobrança direta nos casos em que serviços semelhantes aos prestados às empresas associadas também sejam prestados a empresas independentes de forma comparável. Quando um grupo MNE usa esse método, fica claro para fins de preços de transferência qual serviço foi realizado e como ele foi pago. Isso torna mais simples determinar se a taxa está arm's length.
Método de Cobrança Indireta: Os grupos MNE nem sempre são capazes de aplicar acordos de cobrança direta, especialmente se o valor do serviço não puder ser repartido diretamente a cada empresa associada. Como tal, eles usam métodos indiretos para cobrar por serviços intragrupo. Esses métodos são geralmente baseados na alocação e distribuição de custos. Os grupos MNE devem escolher uma chave de alocação que faça sentido nas circunstâncias da transação e que seja fácil de verificar. Por exemplo, ao alocar custos entre empresas associadas para a prestação de serviços de TI, uma chave de alocação adequada pode ser o número de PCs por empresa associada.
Existem uma série de métodos que podem ser utilizados para verificar o cumprimento do princípio Arm's Length no Transfer Pricing de Serviços Intragrupo. Os mais utilizados são o método CUP ou os métodos baseados em custos, como o método Cost Plus e o método de margem líquida transacional baseado em custos (TNMM baseado em custos).
O método CUP compara o preço e as condições dos serviços intragrupo com os de uma transação não controlada entre partes não relacionadas. É um método apropriado se:
- Um serviço comparável foi prestado entre empresas independentes no mesmo mercado
- A empresa associada em questão também forneceu o serviço a uma empresa independente em circunstâncias comparáveis
E o método Cost Plus adiciona uma markup nos custos do fornecedor para o serviço, para que o fornecedor faça um lucro adequado que leve em conta as funções que ele desempenhou e as condições atuais do mercado. O preço combinado é o preço do Arm's Length para o serviço intra-grupo. O método é mais apropriado se não houver uma transação comparável disponível (onde a natureza das atividades, o uso de ativos e a suposição de riscos sejam comparáveis aos realizados por empresas independentes).
Serviços Intragrupo de baixo valor agregado
Além dos serviços intragrupo comuns, existem os serviços de baixo valor agregado, os quais possuem algumas diferenças na hora de calcular.
A OCDE fornece uma abordagem eletiva e simplificada para aplicar e documentar as taxas Arm's Length para serviços intragrupos de baixo valor agregado. A abordagem envolve:
- Teste de benefícios simplificado
- Processo para determinar os custos associados a serviços de baixo valor agregado
- Capacidade de usar chaves de alocação geral
- Markup de 5%.
Então, o que são serviços intragrupo de baixo valor agregado? Para constituir um serviço intragrupo de baixo valor agregado, um serviço deve ser:
- Suporte por natureza
- Não faz parte do negócio principal do grupo MNE
- Não exija o uso de intangíveis únicos e valiosos e não leve à criação de intangíveis únicos e valiosos
- Não envolva a suposição ou controle de riscos substanciais ou significativos pelo prestador de serviços e não dê origem à criação de riscos significativos para o prestador de serviços
Exemplos de serviços que provavelmente contariam como serviços intragrupos de baixo valor agregado são:
- Contabilidade e auditoria
- Atividades de recursos humanos, como recrutamento e seleção; treinamento e desenvolvimento de funcionários; serviços de remuneração; desenvolvimento e monitoramento de procedimentos de saúde da equipe, segurança e normas ambientais
- Monitoramento e compilação de dados relacionados à saúde, segurança, meio ambiente e normas que regulam o negócio
- Assessoria de comunicação interna e externa e relações públicas
- Serviços jurídicos
- Serviços de TI que não fazem parte da atividade principal do grupo
- Processamento e gestão de contas a receber e a pagar
- Atividades relativas às obrigações fiscais
Serviços Intragrupo não simplificados
Diferentemente dos serviços de baixo valor agregado, citamos abaixo os serviços que podem contemplar alto valor agregado, e, portanto, não se qualificam para abordagem simplificada dos estudos de TP:
- Serviços que constituem o core business do grupo MNE
- Serviços de pesquisa e desenvolvimento
- Serviços de fabricação e produção
- Atividade de compras de matéria-prima
- Atividade de vendas, marketing e distribuição
- Transações financeiras
- Seguros
- Servicos de administração corporativa
- Extração, exploração e processamento de recursos naturais
Nova Legislação de Preços de Transferência - MP 1152/22
A nova legislação de preços de transferência do Brasil, por meio da MP 1152/22, traz em seu artigo 24, as definições de serviços intragrupo:
Art. 24. Os termos e as condições de uma transação controlada que envolva prestação de serviços entre partes relacionadas serão estabelecidos de acordo com o princípio previsto no art. 2º. (Principio arm's length)
§ 1º Para fins do disposto nesta Medida Provisória, considera-se prestação de serviço qualquer atividade desenvolvida por uma parte, incluídos o uso ou a disponibilização pelo prestador de ativos tangíveis ou intangíveis ou outros recursos, que resulte em benefícios para uma ou mais partes.
§ 2º A atividade desenvolvida resulta em benefícios quando proporcionar expectativa razoável de valor econômico ou comercial para a outra parte da transação controlada, de forma a melhorar ou manter a sua posição comercial, de tal modo que partes não relacionadas em circunstâncias comparáveis estariam dispostas a pagar pela atividade ou realizá-la por conta própria.
§ 3º Sem prejuízo de outras hipóteses, será considerado que a atividade desempenhada não resulta em benefícios nos termos do disposto no § 2º quando:
I - a atividade for caracterizada como atividade de sócio; ou
II - a atividade representar a duplicação de um serviço já prestado ao contribuinte ou que tenha a capacidade de desempenhar, ressalvados os casos em que for demonstrado que a atividade duplicada resulta em benefícios adicionais para o tomador conforme previsto no § 2º.
§ 4º São caracterizadas como atividades de sócios aquelas desempenhadas na qualidade de sócio ou acionista, direto ou indireto, em seu interesse próprio, incluídas aquelas cujo único objetivo ou efeito seja proteger o investimento de capital do prestador no tomador ou promover ou facilitar o cumprimento de obrigações legais, regulatórias ou de reporte do prestador, tais como:
I - atividades relacionadas à estrutura societária do sócio ou acionista, incluídas aquelas relativas à realização de assembleia de seus investidores, reuniões de conselho, emissão de ações e listagem em bolsas de valores;
II - elaboração de relatórios relacionados ao sócio ou acionista, incluídos os relatórios financeiros, demonstrações consolidadas e relatórios de auditoria;
III - captação de recursos para aquisição, pelo sócio ou acionista, de participações societárias e atividades relativas ao desempenho de relação com investidores; e
IV - atividades desempenhadas para o cumprimento pelo sócio de obrigações impostas pela legislação tributária.
§ 5º Quando a atividade desempenhada ao contribuinte por outra parte relacionada não resultar em benefício nos termos do disposto nos § 2º ao § 4º, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL será ajustada.
§ 6º Para fins do disposto nesta Medida Provisória, os benefícios incidentais obtidos pelo contribuinte na forma prevista no parágrafo único do art. 10 não serão considerados serviços e não ensejarão qualquer compensação.
Art. 25. Na aplicação do método MCL, serão considerados todos os custos relacionados à prestação do serviço.
§ 1º Sempre que for possível individualizar os custos da prestação do serviço em relação ao seu respectivo tomador, a determinação da base de custos utilizada para fins de aplicação do método a que se refere o caput será efetuada pelo método de cobrança direta.
§ 2º Nas hipóteses em que o serviço for prestado para mais de uma parte e não for razoavelmente possível individualizar os custos do serviço em relação a cada tomador, conforme previsto no § 1º, será admitida a utilização de métodos de cobrança indireta para a determinação da base de custos utilizada para fins de aplicação do método a que se refere o caput.
§ 3º Nos métodos de cobrança indireta, a determinação da base de custos será efetuada pela repartição dos custos por meio da utilização de um ou mais critérios de alocação que permitam obter um custo semelhante ao que partes não relacionadas em circunstâncias comparáveis estariam dispostas a aceitar, que deverão:
I - refletir a natureza e a utilização dos serviços prestados; e
II - estar aptos a produzir uma remuneração para a transação controlada que seja compatível com os benefícios reais ou razoavelmente esperados para o tomador do serviço.
§ 4º Na determinação da remuneração dos serviços de que trata o caput, não será admitida cobrança de margem de lucro sobre os custos do prestador que constituam repasses de valores referentes a atividades desempenhadas ou aquisições realizadas de outras partes relacionadas ou não relacionadas, em relação as quais o prestador não desempenhe funções significativas, considerados, ainda, os ativos utilizados e os riscos economicamente significativos assumidos.
§ 5º Na hipótese prevista no § 4º, será admitida cobrança de margem de lucro determinada de acordo com o princípio previsto no art. 2º somente sobre os custos incorridos pelo prestador para desempenhar as referidas funções.
§ 6º As disposições do caput aplicam-se aos casos em que seja adotado o método MLT como o mais apropriado para a determinação dos preços de transferência dos serviços de que trata o art. 24 e seja utilizado indicador de rentabilidade com base no custo.
Conclusão Geral
Por fim podemos observar que as análises de transfer pricing de serviços intragrupo de acordo com as diretrizes da OCDE, trazem muito mais detalhes do que a metodologia de preços de transferência do Brasil conforme a IN 1312.
Estas análises exigem muita atenção por parte do contribuinte na hora de executar o estudo, principalmente por parte das empresas que nunca realizaram este tipo de abordagem.
Portanto fique sempre atento aos serviços transacionados com sua empresa vinculada, pois eles estão sujeitos as regras de preços de transferência e se hoje eles estão meio esquecidos pela regra atual por conta da dificuldade de aplicação dos métodos, saiba que pela metodologia OCDE e pela nova MP 1152, tudo será analisado e contemplado.
Fique atento aos próximos posts!